
STF barra cobrança de ITCMD sobre heranças e doações vindas do exterior
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), também denominado ITCD ou ITD em determinadas unidades federativas, constitui um tributo de competência estadual incidente sobre heranças e doações. Ressalte-se, contudo, que, nos casos em que o falecido ou o doador possui domicílio no exterior, a exigência do imposto permanece em situação indefinida.
Tal indefinição decorre da redação do art. 155, §1º, III, "a" da Constituição Federal, a qual dispõe que, nessas hipóteses, apenas lei complementar federal poderia autorizar a tributação. Entretanto, o Congresso Nacional ainda não editou referida norma complementar, tampouco há indicativo de sua promulgação em futuro próximo.
STF consolida entendimento
Apesar da lacuna legislativa, alguns estados intentaram disciplinar a matéria por meio de legislação própria. O Estado de São Paulo, por exemplo, instituiu a Lei n. 10.705/2000. Contudo, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade dessa norma em 2021 (RE 851108, sob regime de repercussão geral), fixando o entendimento de que, ausente lei federal, os estados não possuem competência para instituir ou exigir ITCMD relativo a bens localizados no exterior.
Em 2025, a ministra Cármen Lúcia reafirmou tal posicionamento em decisões relevantes:
- No RE 1553620, referente a doação proveniente do Reino Unido para beneficiário paulista, o STF manteve o afastamento da cobrança por ausência de fundamento legal, com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República (PGR).
- Em sucessão relacionada a quotas empresariais sediadas nas Ilhas Britânicas, reforçou-se a necessidade imprescindível de edição de lei complementar federal, mesmo após a promulgação da EC 132/2023.
Reforma Tributária e a confusão normativa
A Emenda Constitucional 132/2023 admitiu, provisoriamente, a aplicação de normas estaduais na ausência de legislação federal. Porém, leis previamente declaradas inconstitucionais, como a paulista, não têm eficácia restaurada automaticamente, uma vez que inexiste constitucionalidade superveniente, conforme preconizado pelo STF.
Ainda assim, observa-se iniciativas estaduais diversas: o Paraná já promulgou nova legislação; Minas Gerais e Rio de Janeiro permanecem sem norma válida; Santa Catarina contempla progressividade no ITCMD, até o limite de 8%. Em São Paulo, tramitam atualmente o PL nº 7/2024 e o PL nº 199/2025, ambos pendentes de aprovação.
Impactos práticos
A indefinição acarreta insegurança jurídica aos contribuintes, especialmente no planejamento de heranças e doações internacionais, e implica significativa redução na arrecadação estadual?em São Paulo, por exemplo, a receita auferida entre janeiro e julho de 2025 totalizou R$ 2,7 bilhões, representando diminuição aproximada de 43% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Perspectivas
Enquanto não houver lei complementar federal, permanece vedada a cobrança do ITCMD sobre transmissões provenientes do exterior, conforme entendimento consolidado do STF. A tentativa de aplicar legislações estaduais anuladas afrontas os princípios constitucionais da legalidade tributária e da segurança jurídica.
Portanto, até que se edite a norma federal competente, impõe-se aos estados aguardar ou aprovar normas compatíveis com os ditames constitucionais.
Autor:
Matheus Kniss é especialista em planejamento sucessório e patrimonial, negócios e reestruturações societárias no Rücker Curi Advocacia e Consultoria Jurídica.